sexta-feira, 23 de novembro de 2012

O DIA EM QUE SÃO PAULO PAROU



O guri que fui, adorava histórias contadas pelas avós. Uma dessas histórias das quais me recordo até hoje, conta que uma vez, numa cidadezinha do “faz de conta” vivia um único médico. Esse dedicado clínico era muito bom. Bom mesmo. Seus diagnósticos eram simplesmente extraordinários. Curava de verdade todos os doentes que apareciam no consultório. Era incansável.
Mas, numa ocasião, ao perceber que estavam todos sãos, não pensou duas vezes: – Vou tirar umas férias! Afinal de contas eu mereço – pensou.
Colocou as malas no carro e partiu. Iria para um local distante dali.
Em dado momento, na estrada, encontrou com uma figura desprezível:
Vestida de negro, rosto cadavérico e portando uma foice, não teve dúvidas em reconhecer: Era a morte.
– Como é? Veio me pegar? Logo agora que vou descansar? – Disse àquela execrável senhora.
– Não – respondeu a abominável criatura. – Vou fazer um servicinho na tua cidade. Aproveito a tua saída, para espalhar uma peste, naquela (até então) saudável cidadezinha. É preciso. Não tenho outra saída. Cumpro ordens superiores. É bom você ficar quietinho, tirar férias e demorar um bom tempo longe daqui. Você vai ser poupado.
– Mas, morte... Tenha dó daquele povo... Matar a todos???
– Bem... Podemos negociar... – Disse a “coisa ruim”. Reduzir para 50%. Que tal um acordo?
– Acordo?? Eu não faço acordo com a morte! Nem vou pedir ajuda aos colegas de fora.
– Então... Não tem jeito...
– Espere! Está bem... Mas jura que matará somente 50% dos cidadãos?
– Juro! Só matarei a metade.
Passados dois meses, o doutor, achando que já era hora, decidiu retornar à cidade, que tanto protegeu.
No caminho encontrou a morte, que pela expressão na caveira, parecia ter cumprido a tarefa. Fingiu que não a viu e seguiu rapidamente para seu destino.
Ao chegar à cidade, surpreendeu-se com o que se deparou a sua frente: Todos haviam morrido.
Numa ira incontrolável, embarcou no seu automóvel e rumou de volta para a estrada, a fim de alcançar a morte.
– Trapaceira! Você mentiu para mim!
– Não senhor! Eu cumpri o que prometi. A peste só matou metade da população... A outra metade morreu de medo...
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Assim está nossa metrópole, em outubro e novembro. O medo, quase provoca mais vítimas, que os terríveis atentados. Ninguém sabe para onde correr, apavorados com ameaças e boatos... Simplesmente aterrorizados.

E isso pode ser somente o começo.
===
Lembro-me também de um poema:
"No caminho com Maiakovski" de Eduardo Alves da Costa
"[...]
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem;
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa.
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
[...]"

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